Celebrado na última quarta-feira de abril, o Dia Internacional do Cão-Guia é uma forma de chamar a atenção do mundo para o importante trabalho dos cachorros treinados para ajudar pessoas cegas ou com baixa visão a ter mais mobilidade, inserção social e independência. Para marcar a data – que em 2025 caiu no último dia do mês, 30 –, a Federação Internacional de Cães-Guia divulgou números globais. Houve um recuo de pouco mais de 4% no total de cães-guia em atividade pelo planeta. Hoje, eles são 18.682. A razão está nos efeitos da diminuição de treinamentos de filhotes na pandemia de covid-19. Isso porque prepará-los para esse serviço leva tempo.

Por outro lado, em 2024 mais cães-guias foram treinados em comparação aos anos anteriores: 2.893. O total vem crescendo desde 2020, quando houve uma queda bruta. Antes da pandemia, cerca de três mil cães eram treinados por ano.

E no Brasil, como é o quadro? O número é muito aquém do “mínimo aceitável”, como pontua a União Nacional dos Usuários de Cães-Guia (UNUCG): 207 em atividade hoje. A presidente da entidade, que vai completar cinco anos em agosto, Maria Villela Ferreira, observa que, segundo o IBGE, o número de pessoas com deficiência visual no país é de 6,5 milhões. Isso dá a dimensão do desafio que enfrentamos.

“Algumas escolas de treinamento nos EUA entregam mais cães do que temos atualmente no Brasil”, disse. “Aos poucos, estamos avançando: este ano passamos dos 200 cães-guia. Mas temos muito a melhorar”, completou.

Por aqui existem dois centros públicos que preparam esses cachorros, que são selecionados ainda filhotes: o Instituto Federal Catarinense, no campus Camboriú, e o Instituto Federal Goiano, no campus Urutaí. Há ainda instituições particulares dedicadas a esses treinamentos específicos. Uma das referências no Brasil é Instituto Adimax, uma entidade sem fins lucrativos cujo centro de treinamento está localizado em Salto de Pirapora, no interior paulista.

Desafios no Brasil

Para Maria Villela, o maior obstáculo está na falta de investimentos no treinamento dos cachorros, que é realizado por etapas. Como os cães-guias não são vendidos (eles são encaminhados gratuitamente a candidatos por meio de um cadastro nacional e é preciso que haja compatibilidade entre o tutor e o animal), o apoio com recursos financeiros é fundamental para que mais pessoas sejam atendidas.

Outro desafio é a etapa de socialização, em que o cão passa a conviver com uma família como parte dos preparativos para o futuro serviço. Essa fase é a segunda.

Como é o treinamento dos cães-guia

O treinamento começa com exames clínicos e psicológicos rigorosos do filhote para garantir que ele esteja saudável e que se avalie o temperamento do animal. Cães-guias precisam ser dóceis, inteligentes e dotados de alta capacidade de adaptação a diferentes ambientes.

Quando o animal entra na etapa de socialização, ele é acolhido por voluntários autorizados que o expõem a diferentes cenários e situações, como shoppings, transporte público e locais com grande circulação de pessoas. A fase dura entre 8 meses e 1 ano e 2 meses. Ela é fundamental para garantir que o cão se sinta confortável em diversos contextos e saiba como se comportar adequadamente.

Depois, o cachorro passa para o treinamento técnico, aprendendo a desviar de obstáculos, identificar entradas, escadas, faixas de pedestres e reagir a situações de risco. Ele também utiliza o arreio, acessório fundamental para a comunicação com a pessoa com que irá viver.

Na última etapa, é feita a formação da dupla cão-usuário, baseada na compatibilidade de características como ritmo de caminhada, tamanho e estilo de vida. O treinamento conjunto pode durar até quatro semanas e, após aprovação, a dupla está pronta para conviver de forma plena.

Maria observou que atualmente temos mais cães-guias treinados no Brasil, enquanto os preparados por instituições estrangeiras são minoria. No passado, eles eram a maioria. Seu primeiro cão-guia, um pastor alemão chamado Spirit, foi doado há dez anos para ela por uma entidade internacional. Agora, Maria tem a companhia de Venom, um labrador preto com quem está há um ano e meio. Ele foi treinado pelo Instituto Adimax.