24/04/2025 - 7:58
Adorados nas redes sociais, os gatos têm uma história antiga de veneração. Que o digam os egípcios. Achados recentes indicam que esse lado exerceu influência na disseminação dos felinos domesticados pela Europa. As hipóteses correntes apontavam que esses primeiros gatos acostumados com humanos chegaram ao “velho mundo” junto com agricultores do norte da África e por uma razão muito prática: o combate a roedores.
Dois estudos independentes – da Itália e da Inglaterra – mostram, porém, que esses felinos adentraram o território, em múltiplas ondas, e se espalharam pelo continente também devido a motivos culturais e por reverência religiosa. Além disso, as pesquisas apontam o Egito e também a Tunísia como ponto de origem da domesticação desses animais.
Um dos trabalhos foi liderado pela Universidade de Roma Tor Vergata e contou com a colaboração de 42 instituições. O estudo envolveu 97 sítios arqueológicos na Europa, analisou 70 genomas antigos de gatos, 17 genomas modernos e de amostras de museus da Itália, Bulgária e do norte da África. Também foram avaliados 37 restos mortais de gatos, datados por radiocarbono.
A outra pesquisa foi conduzida pela Universidade de Exeter e teve a participação de 37 instituições. Foram analisados 2.416 ossos de felinos de 206 sítios arqueológicos, combinando dados morfológicos e genéticos.
Dados genéticos redefinem teoria do Neolítico
Os dois estudos contestam uma teoria comumente adotada, que indica que a domesticação aconteceu no período Neolítico (entre 10 mil anos antes de Cristo e 3 mil a.C) na região chamada Oriente Próximo (que abrange o norte da África e a porção da Ásia próxima ao Mediterrâneo, com países como Turquia, Chipre, Iraque e Egito). Segundo essa linha teórica, gatos selvagens africanos foram domesticados para ajudar os humanos na proteção de alimentos já que roedores rondavam as armazenagens de grãos.
As análises de DNA feitas pelos dois grupos de pesquisadores revelaram, no entanto, que a linhagem dos felinos domesticados do norte da África surgiu na Europa bem mais tarde do que se supunha. Na verdade, milênios depois. Um dos estudos sugere ainda que, no período Neolítico, os humanos também predavam os gatos. Não haveria, assim, uma relação mutual como se imaginava.
Da adoração à perseguição
A disseminação dos gatos domésticos originários do norte da África teve impulsão sobretudo com o domínio romano em território europeu. A respeito do traslado dos animais para diferentes países, os dois estudos abordam a religião como um dos fatores que estimularam a maior presença dos felinos pelo continente.
No Egito, eles eram venerados ao lado de divindades como Bastet (deusa frequentemente representada com cabeça de gato e corpo de mulher, ou apenas como gato), influenciando fenícios, gregos e romanos. De fato, os gatos tornaram-se símbolos de Ártemis ou Diana na prática religiosa greco-romana.
A mitologia nórdica também apresentava felinos ligados à deusa Freyja (frequentemente associada ao amor, fertilidade, beleza, magia e guerreiros em batalha), implicando que crenças espirituais e rituais culturais ajudaram a impulsionar esses animais por geografias mais amplas.
Atitudes positivas em relação ao gato continuaram na Europa cristã primitiva, como ressalta o estudo inglês. “Nossas evidências sugerem que eles foram disseminados por meio de uma rede internacional de casas monásticas cristãs. No entanto, uma mudança na teologia durante o século XII redefiniu os gatos como um símbolo de heresia e maldade”, pontuaram os autores. A espécie manteve sua associação feminina, mas passou a ser negativa com o vínculo a bruxas.